Narciso, personagem da mitologia grega, representa um forte símbolo de vaidade. Quando nasceu, filho do deus do rio Cefiso e da ninfa Liríope, era uma criança de beleza sem igual e predestinada a ter uma vida longa somente se nunca se conhecesse sua própria imagem. Se isso acontecesse, uma maldição recairia sobre ele e o levaria à morte.
A alegoria de Narciso propõe uma discussão sobre os limites da vaidade e da valorização do ego como um dos maiores defeitos da humanidade . Se considerarmos a dinâmica das relações digitais em 2021, a alegoria de Narciso dita tendências. E, para quem conhece a mitologia, também assusta.
Imagine Narciso criando um perfil no Instagram, Facebook ou até mesmo no Pinterest para dar dicas inspiradas nele mesmo. Um Narciso pós-moderno, um “influencer” com o poder de ditar uma nova estética a partir da sua própria beleza, um novo padrão espelhado em seus próprios parâmetros, em uma realidade na qual só há um protagonista: ele mesmo. Agora pense: se um Narciso já é nocivo, pense no estrago que podem fazer milhões de Narcisos em um mundo onde a imagem que se projeta como real – que, por sua vez, é almejada, invejada e se torna meta de vida de muita gente – está cada vez mais longe da realidade. Um paradoxo.
Vivemos uma era abundantemente narcísica, autocentrada, colapsada pela pasteurização das individualidades, mas que conecta 4G e Wi-fi e promove, além de uma pulverização geral de incontáveis “si mesmo” impossíveis de se diferenciar, uma necessidade de pertencimento a uma realidade que só existe na internet. Por consequência, as pessoas estão perdendo suas identidades e suas particularidades, que as tornam indivíduos únicos, e se transformando em produtos digitais .
Além de tudo isso, temos uma variável de peso em 2021, que vem mudando a forma como as pessoas se relacionam pessoalmente e digitalmente desde o final de 2019: a maior pandemia deste século.
O digital virou o “novo normal” e estamos testemunhando o estabelecimento de um formato completamente diferente de interação nas mais diversas esferas, da íntima à profissional, perpassando pelo consumo, entretenimento, educação, cultura e até saúde. Lives e mais lives, webséries, stories... novos formatos de interação que vêm dando bastante certo, segundo dados do setor.
Um estudo recente feito pela Squid, empresa especializada em marketing de influência, mostrou que, em 2020, houve um aumento de 24% no engajamento em posts naquela rede social e 27% no alcance efetivo da ferramenta stories. Realmente, é um potencial imenso que poderia ser muito melhor aproveitado nesse contexto de pandemia se houvesse maior sensibilização, por parte dos influenciadores, sobre o poder que possuem e como seria usar isso para o bem comum diante de uma maior fragilidade mental das pessoas diante dos danos causados pela Covid-19 em todo o mundo e do isolamento num cenário de explosão de conteúdo . Basicamente, questiono a possibilidade de usar o marketing de influência para o bem da sociedade, não das marcas, como ocorre hoje muito em dia, embora haja influenciadores digitais relevantes e que usam seu poder de influência de forma positiva, consciente e abrangente, dentro dos mais diversos ramos de atuação, com o objetivo de esclarecer a sociedade, promover desconstrução e reconstrução, além de autoanálise de seus seguidores. É de se pensar, não é?
É provável que tomem sorvete, gostem de praia e sol. Ou talvez prefiram as montanhas de Minas Gerais. Certamente fazem maratonas de séries, criam playlists em plataformas de streaming, baixam muitos filtros e mergulham de cabeça na onda dos stories. O narcisismo é uma característica de personalidades autocentradas, voltadas apenas para as suas próprias ambições . Dentro de uma sociedade contemporânea que navega na publicação de status o tempo todo, a realização só acontece quando existe uma validação social: “só sou alguém se o outro autenticar a minha existência” – praticamente uma certificação ISO 9001 de seres humanos.
Seriam os influencers, então, os narcisistas pós-modernos? Aqueles que flertam com a possibilidade da preponderância de estilos de vida ditados por eles mesmos? Aí vale tentarmos entender o que leva uma pessoa a acreditar que a sua vida é tão interessante a ponto de criar um mecanismo rotineiro do show do eu. Seria um traço narcísico ou um trabalho? Os entusiastas digitais argumentam que se trata, meramente, de um reflexo da realidade contemporânea, a qual, por sua vez, é digital.
Por outro lado, como no fundo de tudo isso existem as relações humanas e são elas as mais impactadas pela necessidade de aprovação imposta pelo mundo digital, quando se fala em influencers precisamos dedicar tempo a uma análise sobre a real função deles na Nova Economia para entendermos se, com a roupagem atual, eles realmente são necessários.
Influenciadores são importantes? São, em diversos âmbitos, e isso não é de hoje. Mas seriam esses influenciadores narcisistas pós-modernos o melhor que conseguimos? Ainda temos muito a evoluir nesse quesito, principalmente se considerarmos que as necessidades das sociedades vão muito além do simples consumo.
Entendo ser fundamentalmente importante conectar as questões de formação humana para entender cenários, exposições midiáticas e o próprio impacto que o “must be” em relação aos influenciadores digitais causa na população em geral. Essa discussão, muitas vezes, fica no campo do julgamento raso e infundado, noticiado apenas como um fator geracional ou a justificação a partir de uma nova forma de se comunicar.
Atrás de toda máquina, porém, tem uma pessoa construída social e culturalmente, com subjetividades, então não dá pra dizer que existe uma verdade absoluta que explique esse fenômeno contemporâneo da midiatização do eu. Por outro lado, em se falando de mercado e economia, há aspectos positivos a serem considerados, como a transformação digital, as novas possibilidades de se fazer negócios e a produção de conteúdo para internet. Mas, como diria o Tio Ben ao jovem Peter Parker, “com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades”, e a responsabilidade do influenciador digital só aumenta conforme cresce também seu número de seguidores .
Então, a questão não é somente a influência , mas como e por que ela é utilizada . Daria pra ficarmos horas debatendo sobre isso no Brasil de 2021, mas vamos nos ater ao poder da influência dentro das organizações e da relevância digital dentro da Nova Economia.
Quando falamos em aprender, evoluir, inovar e atingir novos patamares, quem é o influenciador no qual precisamos nos inspirar? Quem é o influenciador consciente?
É aquele que faz a diferença em seu campo de atuação, que tem conhecimento profundo para compartilhar, que errou muito, aprendeu e desenvolveu novas formas de pensar. Que é antenado às mudanças de cenário e às novas necessidades que surgem constantemente, que busca mais do que simplesmente respostas, formulando as perguntas certas. Aquele influenciador que se baseia, antes de tudo, na própria verdade e na verdade que o rodeia, partindo dessas premissas para se posicionar e influenciar outras pessoas .
É aquele que se preocupa em trazer conteúdo mais inspiracional, que pode provocar uma mudança ou microrrevoluções em diversos âmbitos. Que se posiciona como um formador de opinião sobre temas que têm potencial para reescrever a história da sociedade e da economia, que questiona o status quo ao mesmo tempo em que propõe novos caminhos e soluções, porque a coisa não é mais apenas sobre influenciar viagens, compras, passeios, restaurantes e, sim, fazer alguma diferença no mundo, na evolução das pessoas enquanto cidadãos conscientes e saudáveis psicologicamente. Inclusive dentro das organizações, influenciadores podem ser muito efetivos no sentido de promover a inovação, apontar novos rumos e compartilhar conhecimento. O ideal, neste caso, é que se trilhe um primeiro movimento no sentido de identificar esses potenciais influenciadores e entender de que forma eles podem contribuir, lembrando que essa troca promove resultados tanto para a empresa quanto para a carreira do profissional. Ainda: dependendo do setor em que a organização atua, esse novo olhar, que une talentos socioemocionais e capacidade de influência pode impactar diretamente na sociedade, ampliando significativamente o alcance de qualquer iniciativa.
Em um momento da história em que nossas vidas pessoais, profissionais e nossa atuação digital se mesclam como nunca, as pessoas estão mudando hábitos e buscando formadores de opinião mais conscientes, já que, diante das incertezas do futuro, fazem mais diferença aqueles que influenciam a reinvenção das sociedades por meio do fomento de diálogos construtivos e positivos.
E nós precisamos, como nunca, de reinvenção no sentido de se criar soluções. Seja para alimentar mais de 7 bilhões de pessoas, para destravar as cidades, para prover saúde, educação, trabalho e oportunidades de forma igualitária, seja para compartilhar conhecimento aprofundado em um mundo tomado pelo excesso de informação. Se tivermos influenciadores com suas próprias verdades alinhadas às reais necessidades das sociedades, teremos influenciadores conscientes a seguir e, juntos, poderemos mudar a realidade dentro das organizações e – por que não? – mudar o mundo.
* Janaína Bezerra é pós-graduada em Mídia, Informação e Cultura pela ECA e atua como Especialista em Design de Aprendizagem na Afferolab
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